Em uma Milonga ...





Em uma milonga tradicional. A música (mecânica) é tocada em breves seqüências, chamadas “Tandas”, de 4 ou 5 tangos seguidos, todos interpretados pela mesma orquestra, tendo estilo e forma similares. As pessoas estão atentas às várias diferenças entre orquestras (dos anos 20, 30, 40 ou 50), e todos têm a sua favorita. A próxima “Tanda” poderá ser de vals argentino. Ou uma “Tanda” de 4 ou 5 milongas.
A palavra “milonga” neste caso significa um exemplar musical cuja dança lhe é própria. É relacionado com o tango, visto que esses dois gêneros de dança partilham uma origem comum e são dançados com a mesma “forma” com poucas variações na “maneira”. Com a Valsa Argentina acontece o mesmo. É prática comum dançar-se as “Tandas” com o mesmo par. Após várias “Tandas” de Tango, Vals ou Milonga, haverá um grupo de outras danças: merengues, salsa ou rock. Por breves momentos. A próxima “Tanda” de tangos será interpretada por uma orquestra diferente e terá um sabor diferente. Alguns breves momentos de música considerada “não-dançável” chamada de “Cortina” separa assim a já conhecida “Tanda” e, nesse momento, todos retornam às suas mesas. Outro hábito é o de “entre-músicas”, presumindo-se que se vai dançar a próxima música com a mesma pessoa, fica-se em frente dela para uma curta conversa. A nova música começa, e todos continuam conversando, sem pressa, durante a primeira fase dessa música. Depois, quase todos ao mesmo tempo, cada homem levanta os seus braços, como um convite para o próximo abraço, e todos os pares presentes no salão recomeçam a movimentar-se. Começar a dançar antes de alguém é tido como uma espécie de suave grosseria, como se começasse a jantar antes de todos estarem servidos. Aquele momento de espera é a posibilidade de conhecer melhor o seu par, que pode até ser um estranho, ouvir a música e preparar-se convenientemente para a sua interpretação.
Normalmente, não se fala enquanto se dança, e termina-se de dançar no final do último acorde. Após sentir-se satisfeito, ou no final de uma “Tanda”, é hábito o homem acompanhar a mulher de volta à sua mesa, regressando logo após ao local onde estava anteriormente. Então, como será a dança “no salão”, no caso de uma milonga? Uma coisa é certa: não importa quão cheio ele está, ninguém se “atropela” .
Improvisar o tango significa, numa perspectiva de sobrevivência, ser capaz de mudar idéias, de direção, no meio de cada passo, com sutileza para evitar os encontrões. Terá de ser capaz também de encurtar os movimentos. Ochos e boleos são executados em miniatura, mas sempre com precisão. Numa sala cheia de gente, as pessoas literalmente modelam a sua dança. Cultiva-se o desafio da criatividade, possível numa sala repleta de pares.
Os pequenos movimentos, mais do que frustrantes, são mais íntimos, mais expressivos, resultado da forte personalidade do tango e de seu bom intérprete. Em uma milonga, todos os pares se movimentam no salão no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. Em alguns clubes, encontra-se por vezes um segundo anel de pares dançando ao redor do perímetro do salão de baile. Este é um lugar desejável para estar, por duas razões: uma larga pista por onde se mover e só existe a única preocupação com os encontrões que surgem contra si somente por um dos lados. (A não ser que bata contra as mesas.) Por isso, desde que tenha adquirido uma posição no círculo exterior terá de mantê-la: evoluindo nem muito depressa, nem muito devagar. Nem todos os movimentos de tango são apropriados numa milonga. Qualquer movimento que perturbe a posição de abraço e os outros pares é indesejado. Os movimentos são despretensiosos; por exemplo, em vez dos violentos boleos, serão pequenos, delicados, sutis mas com personalidade. A idéia é combinar elementos simples, com a criatividade, a individualidade, a comunicação, o controle e a sutileza. Enquanto não se está dançando, também se aprende observando pequenos adornos feitos com os pés ou como o par se abraça. Também se admira os pares só pelo prazer de ver as maneiras ou até mesmo as formas diferentes como interpretam seus movimentos através do estimulo musical. A forma mais antiga de convidar alguém para dançar, seja homem ou mulher, é fixar o seu olhar na pessoa que se pretende. Esteja ele ou ela do lado oposto da sala, seja um amigo ou um estranho, quando se cruza o olhar de cada um, isso corresponde a um convite. Um aceno de cabeça e um sorriso, talvez um olhar para a pista de dança, é a confirmação. O homem se levanta e caminha até à mesa dela. Ela espera por ele no limite da pista. Ambos aguardam um momento para se posicionarem em frente um do outro e erguem os seus braços e terminam com um abraço.
Esse ritual definirá a tônica para o começo da dança. Viver o tango em uma milonga é surpreender-se, emocionar-se, fascinar-se. As noites ali são longas, repletas de momentos de magia e de um verdadeiro mistério.
















No hay comentarios.: